sábado, 24 de outubro de 2009

CARTA DE DOM MOACYR GRECHI POR OCASIÃO DO ENCONTRO DOS ASSESSORES DA ARTICULAÇÃO CONTINENTAL DAS CEBS EM PORTO VELHO DE 27 A 31 DE JULHO DE 2009.


“Pai, eu te agradeço porque escondeste estas coisas
aos sábios e entendidos e as revelaste aos pequeninos,
porque assim foi do teu agrado” (Mt. 11,25-26).



“Gente simples, fazendo coisas pequenas,
em lugares pouco importantes,
consegue mudanças extraordinárias”.
Provérbio africano

Fiquei feliz e grato, como bispo da Igreja Particular de Porto Velho, Rondônia, em ter acolhido, com o coração grande da Amazônia a todos os delegados e delegadas do XII Intereclesial das CEBs, vindos de quase todas as dioceses do Brasil, assim como os irmãos e irmãs convidados vindos de muitos países da América Latina e do Caribe, da Europa, da Ásia, da África e dos Estados Unidos, como também, com muito afeto, meus irmãos Bispos. Louvo ao Senhor por ter feito desta nossa cidade de Porto Velho um espaço de comunhão e comunicação de povos e culturas.

Com este grande coração da Amazônia, quero acolher todos os gritos dos Povos da Terra e os gritos da nossa Mãe Terra, a “Pacha Mama” dos indígenas. A partir do XII Intereclesial e do Encontro de Assessores da articulação continental das CEBs, lhes envio esta carta, expressando meu agradecimento ao Deus e Pai de Nosso Senhor Jesus Cristo, que nos reuniu a todos, todas em Porto Velho, na força do Espírito Santo. Ao mesmo tempo, quero lhes oferecer algumas considerações:

1. As CEBs, célula inicial de estruturação eclesial (Md 15,10, DAp, 197), buscam ser comunidades enraizadas na prática histórica de Jesus de Nazaré, filho de Maria (Gal 4,4) e bebem do testemunho das primeiras comunidades cristãs (At 2,42-47; 4,32-35). Como Jesus, assumem a opção pelos pobres (Mt 9,35-36; Lc 4,14-30; Mt 11,2-6; Lc 7,18-23) e a partir deles anunciam o evangelho do Reino a todos, oferecendo a salvação como desejo de Deus Pai (1Tim 2,4), colaborando na construção da fraternidade e sororidade na humanidade. Seguindo os passos de Jesus, as CEBs testemunham que a vida deve brilhar em primeiro lugar (Jo 10,10) e por sua causa, muitos e muitas foram até o martírio, para defendê-la em nome da Justiça do Reino.

2. Seguindo a prática de Jesus de Nazaré, as CEBs se espelham na Palavra de Deus e a têm como companheira da caminhada. Esta Palavra é refletida, rezada, bebida, contemplada, cantada e ilumina a prática libertadora das comunidades, tornando presente o Mistério Pascal. No Brasil e em outros países da América Latina e do Caribe, em muitos lugares, as CEBs anseiam por uma participação à celebração Eucarística, com um ritmo possível e seguro, como alimento da caminhada (Jo 6) e sinal essencial de sua identidade católica.(DAp 253, Doc. CNBB 87, nº 73).

3. Unindo fé e vida, as CEBs são sementeiras de novas lideranças e de novos ministérios. Seus participantes, como cidadãos e cidadãs, se engajam no Movimento Popular, no Movimento Sindical, no campo e na cidade, nos partidos políticos ligados às lutas do povo, na luta dos povos indígenas, dos Quilombolas, das mulheres, como também participam das Pastorais Sociais, oferecendo às pessoas a descoberta da importância da cidadania (Doc. CNBB sobre eleições, 2006, Introdução). Também das CEBs vemos nascer muitos ministérios que colaboram com todo o Povo de Deus na oferta de serviços que ajudam as Comunidades se fortalecerem no seguimento de Jesus.

4. Por estarem inseridas nos bairros pobres de nossas cidades e na zona rural, as CEBs são a instância missionária da Igreja mais próxima das pessoas. Evangelizam a partir das coisas pequenas. Partilham, muitas vezes, o alimento com aqueles e aquelas que não o têm. Cuidam dos doentes, fazem mutirão na roça e na cidade. Exercem o “Lava pés” no meio do mundo (Jo 13,1-17; Mc 10,45). Frente à desilusão de experiências religiosas anteriores, ajudam muitas pessoas a reencontrar a alegria de viver o seguimento de Jesus em comunidade (Lc 24,13-35).

5. Por isso, não têm medo de enfrentar os conflitos e acreditam que o Espírito do Ressuscitado continua a lhes oferecer luz e força para a caminhada, rumo à construção de uma nova sociedade justa, fraterna, solidária, respeitadora da vida e da Mãe Terra, a caminho do Reino Definitivo, acreditando na Trindade como a melhor comunidade.

6. A partir da Conferência de Aparecida, as CEBs ganham reconhecimento e novo alento; são o lugar eclesial para a comunhão; o espaço de formação para os discípulos missionários; nelas os leigos se integram e vão mostrando frutos abundantes. São ambiente propício para se escutar a Palavra de Deus, para viver a fraternidade, para animar na oração, para aprofundar processos de formação na fé e para fortalecer o exigente compromisso de serem apóstolos na sociedade de hoje. Lugares de experiência cristã e evangelização em meio à situação cultural que nos afeta; fonte segura de vocações ao sacerdócio, à vida religiosa e à vida leiga com especial dedicação ao apostolado. Se desejamos pequenas comunidades vivas e dinâmicas, é necessário despertar nelas uma espiritualidade sólida, baseada na Palavra de Deus, que as mantenham em plena comunhão de vida e ideais com a Igreja local e, em particular, com a comunidade paroquial. Nossas paróquias chegarão a ser “comunidade de comunidades” (Dap 307 a 310).

7. A abertura de nossas pequenas comunidades ao impulso do Espírito Santo contribui para o processo de conversão pessoal e pastoral e ao estado permanente de Missão, pois assumimos o compromisso de uma grande missão em todo o Continente. Nossas dioceses, em todas as suas comunidades e estruturas são chamadas a serem comunidades missionárias e, portanto, o sujeito da Missão. Esta firme decisão missionária deve impregnar todas as estruturas eclesiais e todos os planos pastorais de dioceses, paróquias, comunidades religiosas, movimentos e de qualquer instituição da Igreja. Nenhuma comunidade deve se isentar de entrar decididamente, com todas suas forças, nos processos constantes de renovação missionária e de abandonar as ultrapassadas estruturas que já não favoreçam a transmissão da fé. (DAp 168,362,365 e doc 88/CNBB)

8. Como fruto do Vaticano II na América Latina e Caribe, as CEBs são o modo mais antigo e novo de ser Igreja. Na expressão de D. Pedro Casaldaliga são “o modo normal de ser Igreja”. Por isso, acredito que todos nós temos a responsabilidade de animá-las e fortalecê-las no Brasil e em nosso Continente latino-americano e caribenho, como instância primeira da Igreja. Acredito que “todas as autênticas transformações se forjam no coração das pessoas e se irradiam em todas as dimensões de sua existência e convivência. Não há novas estruturas se não há homens novos e mulheres novas que mobilizem e façam convergir nos povos ideais e poderosas energias morais e religiosas. Hoje, mais do que nunca, o testemunho de comunhão eclesial e de santidade é uma urgência pastoral. (DAp 538, 368)

9. As CEBs contam sempre com Maria, a fiel seguidora de seu Filho Jesus, e nossa mãe (Jô 19, 25-27) que também em seu canto (Lc 1,46-56) faz a opção pelos pobres, para que haja vida digna para todos os seus filhos e filhas. Quero terminar afirmando com D. Helder Câmara: “Eu acredito que o mundo será melhor, quando o menor que padece acreditar no menor”. Na certeza-esperança da presença do Deus da Vida presente na história de seu povo, envio-lhes um abraço em Jesus Cristo Libertador. Irmanamo-nos aos Irmãos e Irmãs cearenses que vão acolher, com espírito fraterno, o 13º Intereclesial das CEBs para continuar a caminhada no seguimento de Jesus.

Dom Moacyr Grechi
Arcebispo de Porto Velho

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